segunda-feira, 19 de setembro de 2016

O ELOGIO DA ABELHA





   Grande mosca verde-azul, mostrando envaidecida as asas douradas pelo Sol, penetrou uma sala e encontrou uma abelha humilde a carregar pequena provisão de recursos para elaborar o mel.

   A mosca arrogante aproximou-se e falou, vaidosa:

   - Onde surges, todos fogem. Não te sentes indesejável? Teu aguilhão é terrível.

   - Sim - disse a abelha com desapontamento -, creia que sofro muitíssimo quando sou obrigada a interferir. Minha defesa é, quase sempre, também a minha morte.

   - Mas não podes viver com mais distinção e delicadeza? - tornou a mosca - porque ferroar, a torto e a direito?

   - Não, minha amiga - esclareceu a interlocutora - não é bem assim. Não sinto prazer em perturbar. Vivo tão somente para o trabalho que Deus me confiou, que representa benefício geral. E, quando alguém me impede a execução do dever, inquieto-me e sofro, perdendo, por vezes, a própria vida.

   - Creio, porém, que se tivesses modos diferentes... se polisses as asas para que brilhassem à claridade solar, se te vestisses em cores iguais às minhas, talvez não precisasses alarmar a ninguém. Pessoa alguma te recearia a intromissão.

   - Ah! não posso despender muito tempo em tal assunto - alegou a abelha criteriosa. O serviço não me permite a apresentação exterior muito primorosa, em todas as ocasiões. A produção de mel indispensável ao sustento de nossa colmeia, e necessária a muita gente, não me oferece ensejo a excessivos cuidados comigo mesma.

   - Repara! - disse-lhe a mosca, desdenhosa - tuas patas estão em lastimável estado...

   - Encontro-me em serviço - explicou-se a operária humildemente.

   Não! não! - protestou a outra - isto é monturo e relaxamento.

   E limpando caprichosamente as asas, a mosca recuou e aquietou-se, qual se estivesse em observação.

   Nesse instante, duas senhoras e uma criança penetraram o recinto e, notando a presença da abelha que buscava sair ao encontro de companheiras distantes, uma das matronas gritou, nervosa:

   - Cuidado! Cuidado com a abelha! Fere sem piedade!...

   A pequenina trabalhadora alada dirigiu-se para o campo e a mosca soberba passou a exibir-se, voando despreocupada.

   - Que maravilha! - exclamou uma das senhoras.

   - Parece uma joia! - disse a outra.

   A mosca preguiçosa planou... planou... e, encaminhando-se para a copa, penetrou o guarda-comida, deitando varejeiras na massa dos pastéis e em pratos diversos que se preparavam para o dia seguinte. Acompanhou a criança, de maneira imperceptível, e pousou-lhe na cabeça, infeccionando certa região que se achava ligeiramente ferida.

   Decorridas algumas horas, sobravam preocupações para toda a família.
   A encantadora mosca verde-azul deixara imundície e enfermidade por onde passara.

   Quantas vezes sucede isto mesmo, em plena vida?

   Há criaturas simples, operosas e leais, de trato menos agradável, à primeira vista, que, à maneira da abelha, sofrem sarcasmos e desapontamentos por bem cumprir a obrigação que lhes cabe, em favor de todos; e há muita gente de apresentação brilhante, quanto a mosca, e que, depois de seduzir-nos a atenção pela beleza da forma, nos deixa apenas as larvas da calúnia, da intriga, da maldade, da revolta e do desespero no pensamento.



    Pelo Espírito Neio Lucio. Psicografia de Francisco Cândido Xavier.
    Livro: Alvorada Cristã. Lição nº 20. Página 89.


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